«Como nos sincronizamos numa comunidade virtual, onde faltam quase todos os sinais que conectam os cérebros?»
Online, pertenço a uma rede social, o Facebook. Ocasionalmente, espreito este mundo para dizer olá aos meus Amigos e perceber o seu estado de espirito. Amigos distantes fisicamente tornaram-se mais próximos e a presença certa nesta Rede permite-me «encontrá-los» e estar a par dos seus estados de espirito. Nesta comunidade, há a sensação de proximidade.
No entanto, a relação que se estabelece é aleatória, periódica ou opcional. Apesar do carácter convivencial, aberto e interactivo, há autores que consideram que estas comunidades promovem o isolamento. Segundo Sfez, «não há comunicação nem interacção, apenas interactividade com a máquina e dominação desta sobre o homem [, um ]tipo de interactividade, onde o sujeito de comunicação parece estar simultaneamente ausente e presente, impondo-se pela telepresença, situando-se simultaneamente online e offline. [ii]Aqui, a interactividade sobrepõe-se à comunicação, negando a sua dimensão representativa e relacional.
Uma comunidade online, mediada por computador pela Internet obedece a regras dinâmicas cujo fim é fomentar a comunicação e interacção. No entanto, o corpo, existente mas não visivel interage com o computador. Segundo Tendeiro (2008), «trata-se de uma interacção biotécnica local, entre corpo e máquina, que se liga a um ambiente local. Junto do ecrã, as capacidades motoras, sensoriais e intelectuais são activadas e usadas de forma diferente, ou seja, adaptadas ao contexto da relação interactiva com a máquina. O ecrã de cada participante torna-se o portal e o suporte sendo o corpo e a mente que interagem com o computador.(...) A conexão é multidireccional, cada indivíduo estabelece um enorme fluxo de ligações com outros utilizadores, sendo a conversação virtual e a sua realidade, construída em rede. »[iii]Para mais, neste contexto, a comunicação não-verbal é verdadeiramente secundária pois a sua expressão está limitada à não-presença fisica dos interlocutores.
Assim sendo, «Cai-se no fechamento do eu, num solipsismo.»[iv] Segundo Sfez (1991), na comunicação online, o emissor, a mensagem e o receptor são suprimidas, bem como a realidade interactiva dos sujeitos, inseridos num meio. «Aqui, a comunicação não é mais do que a repetição impertubável do mesmo (tautologia) no silêncio de um sujeito morto, ou surdo mudo, encerrado na sua fortaleza interior (autismo), captado por um grande Todo que o engloba e dissolve até ao menor dos seus átomos paradoxais.(...) A comunicação faz-se aqui de si para si mesmo, mas de um si diluido num todo.»[v]
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[i] Goleman, Daniel (2006); Inteligência Social; p.69; Lisboa:Temas e Debates
[ii] Tendeiro, Graça; Revista Vértice - Nº 138, Janeiro/Fevereiro de 2008. OS CHATS – UM ESPAÇO DE COMUNICAÇÃO E INTERACÇÃO OU A AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO?
[iii] Idem
[iv] Idem
[v] Sfez, Lucien, A Comunicação, Lisboa, Edições Instituto Piaget, p.144. s. d..
NEUROANATOMIA DE UM BEIJO
Não me recordo do meu primeiro beijo... mas recordo de um momento em que me senti impelida para outro, como se atraida por uma força magnética insuperável. «Olharmo-nos nos olhos liga-nos» - que verdade tão insofismável!
Curioso é perceber que tal sucede devido à ligação neural existente entre os olhos e a «área orbifrontal (COF) do córtex pré-frontal.» e ao facto de tal permitir, por um lado, o reconhecimento das emoções sentidas pelo Outro e, por outro, compreender o mundo social em que habitamos, ao estabelecer uma conexão entre a via superior e a via inferior.
O COF é, portanto, o circuito neural que nos permite, por um lado, sentir prazer no estar-com-os-outros e, por outro, avaliar a «estética social», determinando os nossos gostos e repulsões.
É a partir deste circuito que se desenvolve o envolvimento empático entre dois individuos, a partir das primeiras impressões.
Estas primeiras impressões resultam de um julgamento instantâneo, de uma «intuição social» que será, provavelmente, o produto da actuação das células fusiformes as quais, dada a sua constituição, funções e presença numerosa no córtex cerebral, garantem uma «alta velocidade da via inferior», constituindo aquilo que Goleman nomeia por Sistema de Orientação Social.
Portanto, «o COF ajuda a orientar o que fazemos a partir do momento em que sabemos o que sentimos em relação a alguém.» e tal processo ocorre sempre que estamos em interacção como o outro. Apesar disto, temos a capacidade de agir para lá das impressões instantâneas. Através da via Superior, flexibilizamos as «conclusões» que retirámos através da via inferior, abrindo espaço para novas possibilidades de acção. Assim sendo, o COF funciona como um regulador compreensivo da acção social
Deixo-vos uma música/letra repleta de sentidos golemanianos
http://www.youtube.com/watch?v=aMKHMcS7X3g
ALTRUÍSMO
Altruísmo é. por definição, uma entrega desinteressada ao Outros um descentramento empático do Eu em direcção ao Outro - com quem nos conectamos. Apesar das inúmeras experiências de violência e agressividade que todos conhecemos, o que é natural no homem é estar em paz com o Outro.
Segundo Thomas Nagel, o Altruísmo consiste numa «vontade para agir em consideração dos interesses das outras pessoas, sem necessidade de motivos ulteriores.» Nesta prática altruística, reconhecemo-nos no lugar do outro, enquanto possibilidade de ser. Praticar intencionalmente o Bem, na pessoa do Outro, é a finalidade da acção.
No mundo em que vivemos, caracterizado pelo individualismo e pela «falta de tempo», os individuos estão de tal modo auto-absorvidos que esquecem todos os demais em seu redor, não se predispondo a estabelecer relações de Sincronia ou a relacionar-se de moso altruísta como os outros.
DOR EMOCIONAL - Reflexão a partir da leitura de Inteligência Social, de Goleman
Ontem recordei um livro de Savater, As Perguntas da Vida, em que o autor afirma que "a convivência social nunca é indolor", relembrando a célebre frase de Sartre "O inferno são os outros".
Será realmente assim?
Na perspectiva de Goleman, o Outro que nos acompanha e interpela torna-se Isso, coisifica-se na medida da relação desinteressada ou abusiva de um Eu com um Outro, em que a conexão empática não existe. Na relação Eu-Isso, o Outro é um qualquer meio e não um fim em si mesmo, com quem me relaciono com uma "indiferença emocional e afastamento". Pelo contrário, na relação Eu-tu estabelecesse "uma ressonância com os teus padrões emocionais e os teus mapas mentais.(...) à medida que cresce a identificação entre os dois , as categorias mentais sofrem uma espécie de fusão, de tal modo que, inconscientemente, começamos a pensar naqueles que são mais importantes para nós quase como pensamos em nós próprios.” Eu diria mesmo que este Outro supera-nos e determina a nossa Felicidade, na medida da simbiose sentida.
Goleman afirma também algo que me conduziu à estupefacção e que passo a citar: “O modo Isso tem nítidas vantagens na vida do dia-a-dia, quanto mais não seja por despachar as questões de rotina. As regras sociais implícitas ajudam-nos a decidir com que pessoas não precisamos de nos sintonizar. A vida quotidiana está cheia delas: [(???? O Sr. deve ser um infeliz!!!)] sempre que devemos interagir com alguém exclusivamente em termos do seu papel social – a empregada de mesa, o funcionário da loja – tratamo-lo como um Isso unidimensional [????], ignorando o «resto», a sua identidade humana.”
Não poderia estar mais em desacordo. Tratar o Outro como um Tu ou um Isso não é uma opção. É um Dever do Eu considerar o Outro como um Eu em si mesmo. A acção ética exige que ultrapassemos o nosso ponto de vista individual e nos coloquemos no lugar do Outro. Só assim será possível construir sentido, na vivência partilhada com os outros.
É importante ser Inteligente, em termos sociais: possuir consciência social e facilidade social. No entanto, o homem não pode nem deve deixar de ser ser quem é. Certamente que deverá dominar impulsos, instintos, «subjugar » a via inferior aos ditames da racionalidade; não obstante, viver disfarçadamente, construir relações pelo «politicamente correcto» per si, parece-me verdadeiramente redutor e contrário ao progresso da Humanização necessária do Mundo.
PORQUE SOMOS MAUS?
A pergunta "Porque somos maus?" pressupõe uma abordagem mundividente da existência humana, que não cabe aqui elaborar. Pressupõe também saber a que nos referimos quando falamos de Mal, na sua posição de reverso dictómico de Bem.
Vulgarmente, "entendemos por Mal a ausência ou privação de uma qualidade necessária à integridade ou perfeição de um ser" (Freitas). A compreensão do Mal exige a compreensão prévia sobre o ser humano, situado num tempo histórico. Actualmente, diremos que o mal se manifesta como “um estado natural do ser humano, marcado pela agressividade e pelo egoísmo [por um lado] e, por outro [como] o produto da assunção da liberdade de escolha” (Albuquerque). Assim, assumindo com Hannah Arendt que “a consideração da intencionalidade (...) não é suficiente para definir a malevolência”, assumirei que “o bem e o mal se constituem permanentemente como escolhas para o ser humano, manifestações da sua liberdade essencial” (Albuquerque).
Neste enquadramento, gostaria de vos deixar o testemunho de um psiquiatra e psicólogo austriaco, que viveu entre 1905 e 1997, fundador da Logoterapia, uma terceira via da psicoterapia (depois de Freud e de Adler) que “define o ser humano como ser autónomo e responsável, cuja consciência é o orgão de sentido que o apoia a ultrapassar condicionantes, à procura de um sentido para as situações que se nos deparam ao longo da vida”(Cyrous, 2007). Este senhor, de família judaíca, viveu, entre 1941-45, nos campos de concentração de Dachau e Auchwitz. Da sua vivência, resultou um bonito e doloroso lexto intitulado Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração, do qual deixo um excerto, a propósito desta nossa discussão sobre a Maldade Humana:
«Existem sobre a terra duas raças humanas e realmente apenas essas duas: a “raça” das pessoas direitas e a das pessoas torpes. Ambas as “raças” estão amplamente difundidas. Insinuam-se e infiltram-se em todos os grupos: não há grupo constituido exclusivamente de pessoas decentes, nem unicamente de pessoas torpes. Neste sentido não existe grupo de “raça pura”, e assim também havia uns e outros sujeitos decentes no corpo da guarda.
Sem dúvida, a vida no campo de concentração ensejava o rompimento de um abismo nas profundezas extremas do ser humano. Não deveria surpreender-nos o facto de que essas profundezas punham a descoberto simplesmente a natureza humana, o ser humano como é – uma liga do bem e do mal! A ruptura que perpassa toda a existência humana e distingue o bem do mal alcança mesmo as mais extremas profundezas e se revela até no fundo desse abismo aberto pelo campo de concentração.
Ficamos conhecendo o ser humano como talvez nenhuma geração humana antes de nós. O que é, então. O ser humano? É o ser que decide o que ele é. É o ser que inventou as câmaras de gás; mas é também aquele ser que entrou nas câmaras de gás, erecto, com uma oração nos lábios.» (Frankl, 1977ª, pp.83-84).
Muitas razões haverá para ser e justificar o mal. No entanto, uma consciência libertadora conduzirá sempre o homem no sentido da Afirmação do Bem, entendido como valor social, inalienável, condição existencial do Ser-se Humano.
Cabe a nós, educadores do presente e do futuro, trabalhar neste sentido da afirmação do homem enqunto ser Livre e Responsável, capazes de decidir, de optar pelo caminho a prosseguir, apesar dos circunstancialismos degradantes e bestiais em que possa estar inserido.
É esta a minha convicção, que convosco partilho! Bem hajam!
Referências Bibliográficas
Albuquerque, C.P. (2008). A Maldade Humana: Fatalidade ou Educação?. Edições Almedina S.A, O triunfo de Caim. A Ética como um desafio à natureza humana? (pp. 63-79). Coimbra: Centro de Psicopedagogia da Universidade de Coimbra.
Cyrous, S (2007). Viktor Frankl – História de uma vida. In Documentos de apoio ao 1º Curso de Logoterapia. Lisboa: ISPA.
Frankl, V. (1991). Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração. Petrópolis: Editora Vozes.
Logos, Enciclopédia Luso-Brasileira de Filosofia. Lisboa: Ed. Verbo.

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